domingo, 28 de abril de 2013

Amores e abismos


O amor que nada espera, por consequência, nada pode dar. Porque, contradizendo o já dito, da expectativa nasce a vontade, o impulso. Para os que acreditam, onde, invés de terra, há a ideia, a vontade, a promessa, o abismo entre o realizar e o sonhar. Abismo, temo, profundíssimo. Uma vez lá, não há mais caminho de volta.
Mergulhar assim, sem medo - ou mesmo cheio deles - é irracional. Ótimo. Racionalidade, nem de longe combina como amor. Aliás, racionalidade para quê? O racional não se joga no abismo. Muito pelo contrário, constrói pontes seguras e firmes para outros caminhos. Caminhos de novas expectativas e assim, coitados, tanto esperam e, no final, calados, desfazendo o que foi cantado pelos hermanos, não são coroados como nada.
Cavar abismos todos e dias e de lá de cima despencar, é isso o que eu quero. Cair e, feliz da vida, nunca mais voltar.

sexta-feira, 19 de abril de 2013

Carta ao amante II


E continuou a escrever, coitado, como se alguém, algum dia, fosse ler:

"... talvez, pra lá de Bagdá, em meio a tanta bomba, nosso amor, meu amor, vá reinar. Reino, logo te aviso, sem súdito. Apenas dois escravos, surrados, cansados e, costumeiramente, maltratados. Eles querem somente um pouco de água, descanso e calma.
Falta um pedaço em cada um. Um pedaço do o outro. O outro que, do outro lado, vai indo pra longe, mais longe e longe... nosso carinho é como pedra solta no rio. A correnteza leva pra longe, mas a água continua a tocar."

segunda-feira, 15 de abril de 2013

Carta ao amante I


Na carta, escrita e reescrita tantas mil vezes, ele dizia:

"... amor, o mundo que eu tenho é o mundo que você me deu e, em verdade, te digo: sem você, nele não sei andar. As coisas sagradas, tão mais sagradas são se você as toca. E agora, por onde caminhar? Por onde caminhas?
Não é drama. Aliás, não é só drama. É drama também, drama e saudade, drama e paixão, drama e amor, é drama e qualquer coisa que você queira nomear. Mas, mais uma vez digo: não é só drama.
Não quero mais chorar e espero que essa carta chegue até você. Chegue molhada com as minhas lágrimas, borrada com o meu arrependimento e límpida como o meu amor. Não duvide, é límpido como água, conturbado como maré revolta. Nesse tempo longe, te pergunto: aprendeu a navegar? Espero que sim, quero - usando essa rima podre - ser eternamento o seu mar..."